Fabiana Fontana
Coordenadora de Inteligência de Negócios DSM
O ano de 2022 vai terminando com desaceleração no crescimento econômico mundial. Segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) em seu outlook de outubro, o PIB mundial deve alcançar 3,2%, e esse efeito deve se arrastar para o ano que vem. Em outras palavras, haverá queda na atividade e na renda das principais economias. No entanto, o cenário para 2023 ainda não é de recessão, mas de um crescimento global mais fraco, de 2,7% segundo o órgão. O que está acontecendo? Como isso pode nos afetar?
Em primeiro lugar, em todo o mundo e, principalmente, nas economias desenvolvidas, a inflação continua alta. Herança de uma sequência de choques, a começar pela Covid-19, que impôs lockdowns ao redor do planeta e desestruturou as cadeias produtivas, gerando pressão sobre o fornecimento de muitos produtos. E, por outro lado, causando enorme impacto na demanda, à medida que os países geraram aumento de renda com programas de auxílio necessários para o momento. Com isso, a adaptabilidade da oferta falhou, o que constituiu em falta de capacidade para antecipar os efeitos na inflação, um desequilíbrio no balanço de oferta-demanda. Fato que, em fevereiro deste ano, foi potencializado pela guerra entre Rússia e Ucrânia, que colocou o mundo em alerta, a Europa sob ameaça de desabastecimento de gás, principal fonte de energia desses países, e os mercados agrícolas angustiados com a menor oferta de grãos e fertilizantes, por exemplo.
Para conter a inflação, o remédio amargo usado pelos bancos centrais, com destaque para o norte-americano (Fed), é um velho conhecido da economia brasileira e das demais emergentes. Uma política monetária contracionista, através do aumento das taxas de juros, que deve gerar um crescimento aquém do esperado e volatilidade nos mercados financeiros. Podemos esperar que o dólar permaneça forte devido a uma maior aversão ao risco.
Conforme projeções do Itaú BBA, nos Estados Unidos, a taxa básica de juros deve atingir 5,25%-5,50%, com o PIB desacelerando para 0,0% e a inflação em 3,0% em 2023. Já na União Europeia, o Banco Central deve subir a taxa de juros para 2,5%. Na China, nosso principal parceiro comercial quando falamos em carne bovina, a expectativa também não é favorável. Medidas adotadas para conter novos surtos de Covid-19 têm prejudicado o setor de serviços. Embora surpresas positivas tenham aparecido no PIB do terceiro trimestre de 2022, os sinais de desaceleração econômica ainda estão presentes. O setor imobiliário do país asiático é muito relevante para a riqueza das famílias e vem sofrendo nos últimos tempos. A expectativa é que a China cresça 4,5% em 2023.
Adicionalmente, a Opep+ anunciou um corte na produção, o que deve contribuir para manter os preços do petróleo em patamar alto, mesmo com a desaceleração da economia mundial. Por fim, a guerra na Ucrânia entrou em uma nova fase, bem mais preocupante. Alguns economistas acreditam que possivelmente 2023 registre o menor crescimento econômico mundial desde 2001, sem contar a crise de 2008/09 e a pandemia.
Para mudar esse cenário de baixo crescimento, o mundo depende de uma melhora na expectativa de desempenho chinês, de que a política monetária empregada pelos países seja bem-sucedida e do curso da guerra na Ucrânia.
Aqui no Brasil, 2022 seguiu entregando coisas boas para 2023. A previsão de crescimento subiu para 2,8% neste ano, uma exceção no cenário global, e para 1% em 2023, conforme o relatório Focus do Banco Central do Brasil. A atividade econômica surpreendeu no primeiro semestre do ano devido aos preços favoráveis das commodities, à normalização das atividades pós-pandemia e ao aperto monetário iniciado bem antes do que nas economias desenvolvidas. Os indicadores do mercado de trabalho têm mostrado importantes avanços, a taxa de desemprego medida pelo IBGE está no menor nível desde 2015 (8,9%) e a massa salarial vem se recuperando pós-pandemia.
Por outro lado, vivemos um momento de forte incerteza após o período eleitoral. A escolha da equipe do novo governo e a direção da política econômica estarão no centro dos debates nos próximos meses. A sustentabilidade das contas do governo são uma preocupação. Isso corrobora um cenário de dólar forte e de aumento do risco local. Com isso, as revisões baixistas de inflação, feitas pelas principais instituições financeiras brasileiras para os anos de 2022 e 2023, pararam e, provavelmente, a taxa Selic deve demorar mais tempo para cair.
É esperado que a desaceleração global venha enfraquecer o crescimento nacional, diante de um quadro em que parceiros comerciais, de aperto das condições financeiras e de redução nos preços de commodities, o que pode afetar de alguma maneira os nossos negócios.
As condições de mercado da carne bovina em 2022 se mostraram mais desafiadoras do que esperávamos no início do ano. Começamos o ano com o boi gordo sendo pago a R$ 340.93/@ em São Paulo e terminamos outubro recebendo R$ 299.91/@. Uma desvalorização de 12%. Com a oferta de gado mais alta e o consumo interno devagar, a indústria tem testado preços mais baixos. No curto prazo, podemos ver alguma evolução no preço da carne em função do abastecimento para o final do ano e para a Copa do Mundo. Vale lembrar que o consumo das famílias responde por mais de 60% do PIB brasileiro, segundo dados da FGV, e o cenário futuro indica condições menos favoráveis para contrair novos empréstimos e honrar dívidas.
Pelo lado das exportações, o ano vem batendo recordes. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne Bovina (Abiec), o Brasil exportou, em outubro de 2022, 82 mil toneladas de carne bovina in natura, o que equivale a um aumento de 129% em relação ao ano de 2021 em função do embargo chinês.
No mercado global de carne bovina, segundo o Rabobank, os preços locais permaneceram relativamente estáveis no terceiro trimestre. Os valores foram recordes na Austrália (+8%) e na Nova Zelândia (+5%) e caíram no Brasil (-7%), na Argentina (-4%) e no Uruguai (-7%). Nos Estados Unidos, ficaram estáveis. No entanto, a valorização do dólar tem favorecido os países exportadores, com os preços do boi geralmente caindo em dólares.
Um novo ano vem por aí e temos que ter todas essas questões em mente, para formular o planejamento de nossos negócios. De fato, 2023 será um ano em que a produtividade terá um papel importante na condução e nos resultados dos nossos negócios. Por esta razão, cada vez mais será exigido da pecuária profissionalização dos processos, cuidado com os custos e utilização de ferramentas para comercialização.