Rogério Goulart: Chave para o equilíbrio

Controle financeiro é fundamental para o sucesso das fazendas

Mylene Abud

Para Rogério Goulart, o pecuarista que não tem os custos de produção na ponta do lápis navega em um rio à noite, sem lua, com nevoeiro denso. “Você mais ou menos sabe o rumo de onde tem que ir, pois já navegou ali antes, mas estará bem devagar. Nem de longe chegará mais rápido, ou com menos risco se compararmos a um outro barco que possui um farol para te iluminar o que tem pela frente”, afirma ele, usando o “farol” como metáfora para o controle financeiro da fazenda, cujos dados apontam para a tomada correta de decisões.

E ele fala com conhecimento de causa. Editor e fundador da Carta Pecuária, além de consultor respeitado no mercado, Rogério Goulart começou a trabalhar desde cedo. Nascido em Goiânia (GO) em uma família de pecuaristas, formou-se em Administração de Empresas pela PUC-SP, cidade na qual atuou no antigo pregão da BM&F e, posteriormente, em mesa de commodities agrícolas, especialmente no mercado de café e boi gordo.

Além da experiência no mercado financeiro, Goulart atua no setor de engorda de bovinos e administra as fazendas da família. Com esse olhar também de dentro da porteira, ele prega que a preparação é essencial para o equilíbrio do negócio. “A fazenda tem que responder a três perguntas para o seu proprietário: Quantos animais posso colocar aqui dentro? Quanto tempo esses animais demorarão para sair daqui gordos ou bezerros prontos? Qual será a qualidade desse produto que você vai me entregar? A resposta para essas três perguntas, aliada a uma gestão de custos, é a chave”, ensina ele, na entrevista que você confere a seguir.

Noticiário – Este ano marca o início da virada do ciclo pecuário. Como os pecuaristas podem se preparar agora para desfrutar lá na frente?
Rogério Goulart – De fato, neste ano, o mercado já começou a virar. Os preços pararam de cair no ano passado e, de lá para cá, já estão em alta, apesar de que a alta ainda está tímida. Porém, a maré já mudou. Os pecuaristas podem se preparar para surfar essa onda de três maneiras. A primeira é preparar os pastos com correção de solo e adubação. O intuito é conseguir estocar uma maior quantidade de animais na fase de alta. A segunda é ajustar a nutrição para que esses animais fiquem sadios e se desenvolvam no tempo correto para aproveitar esse tempo de alta. A terceira é refletir sobre o perfil de estoque de gado dentro da fazenda. Queremos animais mais novos agora para poderem surfar por mais tempo essa onda.

Noticiário – Quais as expectativas para o setor ainda neste segundo semestre de 2024?
Rogério Goulart – O mercado espera alta já neste segundo semestre. A bolsa trabalha com uma melhora de 8% nos preços até a entressafra deste ano, que correspondem aos meses de outubro e novembro, historicamente. Esse valor está sujeito à oferta de fêmeas que estará disponível para abate daqui para a frente.

Noticiário – E os principais desafios para os pecuaristas?
Rogério Goulart – Acredito que o principal desafio para o pecuarista é entender que os preços do boi gordo, vaca e bezerro são as bases das flutuações nos preços de longo prazo da pecuária. Estar ciente, e preparado para aproveitar as fases de altas dos ciclos de preço, melhora muito as margens de lucro do negócio. Mas essa preparação – e o conhecimento implícito de como o ciclo funciona – não é natural em um primeiro momento, pois estamos acostumados a fazer as coisas sempre do mesmo jeito, sem abrir espaço para entender que há uma lógica em como os preços da pecuária oscilam no longo prazo.

Noticiário – Em sua opinião, o tripé gestão/manejo/nutrição é a base para o sucesso das fazendas? É preciso primeiro fazer a lição dentro da porteira para depois disputar o mercado?
Rogério Goulart – Sem dúvida, estar com a fazenda preparada é a chave para isso tudo se equilibrar. A fazenda tem que responder a três perguntas para o seu proprietário. Quantos animais posso colocar aqui dentro? Quanto tempo esses animais demorarão para sair daqui gordos ou bezerros prontos? Qual será a qualidade desse produto que você vai me entregar? A resposta para essas três perguntas, aliada a uma gestão de custos, é a chave.

Noticiário – Em suas palestras, o sr. costuma falar que tudo gira em torno da comercialização. O que acontece com os produtores que não conhecem seus custos de produção?
Rogério Goulart – Não conhecer os custos de produção é navegar em um rio à noite, sem lua, com nevoeiro denso. Você mais ou menos sabe o rumo de onde tem que ir, pois já navegou ali antes. Você estará bem devagar. Nem de longe chegará mais rápido, ou com menos risco se compararmos a um outro barco que possui um farol para te iluminar o que tem pela frente. O farol é o controle financeiro da fazenda e a correta interpretação do que fazer usando as informações levantadas pelos seus custos de produção.

Noticiário – O sr. também comenta que é mais fácil ganhar na Mega Sena do que acertar o preço do boi. Essa volatilidade do mercado faz parte do jogo?
Rogério Goulart – Os preços sempre foram muito voláteis, por isso é inútil prever o futuro. O que podemos fazer é entender o viés do mercado. Se ele está com uma maior probabilidade de subir ou cair durante dois ou três anos pela frente. Essa visão, a figura de quem nos pode dá-la, é a correta interpretação de onde estamos, agora, dentro do ciclo pecuário. Saber onde estamos nos permite um vislumbre do que teremos pela frente.

Noticiário – Como os pecuaristas podem se precaver? Travar os preços continua sendo um bom caminho?
Rogério Goulart – Sim, precaver-se é condição básica para não perder dinheiro com a venda de seus animais. Veja, o lucro temos que ter no nosso negócio. Ele tem que ser eficiente o suficiente para nos retornar margem de lucro. Bolsa é algo para usarmos para evitar problemas, e o principal problema são as quedas nos preços que nos podem gerar prejuízo. Então, a Bolsa tem que ser usada para evitar prejuízos. O pecuarista tem que saber os seus custos de produção para usar as ferramentas da bolsa, especialmente os contratos de opções sobre os futuros, para fixar, ou segurar, pelo menos os seus custos de produção. Se conseguir nos próximos 40 anos trabalhar com bois e com seguros com o objetivo de diminuir a chance de perder dinheiro com o seu negócio, penso que isso já é um excelente resultado de uma boa gestão de risco.

Noticiário – Em 2024, a Tortuga® celebra 70 anos. Em sua experiência como pecuarista e consultor, qual a relevância de uma marca tão longeva para a pecuária?
Rogério Goulart – A Tortuga® é sinônimo de qualidade e nutrição. A noção que veio dos meus pais é que temos que dar nutrição adequada ao gado, e cresci sabendo que a Tortuga® sempre foi líder nesse quesito, buscando ficar à frente do uso das tecnologias para o produtor ter o melhor que as ciências agrárias podem nos oferecer em nutrição adequada à cada fase de crescimento e engorda dos animais.

Noticiário – Para fechar, como o pecuarista pode saber se a sua fazenda está preparada para o futuro?
Rogério Goulart – Primeiro, o mais importante, se ele consegue dizer qual o custo atual do seu bezerro e dos seus animais nos pastos. Além disso, dizer o custo final dos animais gordos, tanto faz machos ou fêmeas, que ele embarcou na semana passada. Se ele sabe hoje quais serão os seus custos futuros – daqui há quatro ou seis meses à frente. Se ele tem registrado os ganhos de peso mensais do seu gado, as capacidades de suporte de cada um dos seus pastos, o consumo médio da nutrição que é fornecida ao gado, além de quanto está conseguindo receber de margem de lucro na finalização das suas vendas. Com esses dados na mão, ele verá todo o potencial que o seu negócio já tem e, mais ainda, até onde poderá chegar.

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