Impactos da Peste Suína Africana no mercado de proteína animal

Com o forte impacto causado na produção de carne suína na China, a Peste Suína Africana (PSA) passou a ser um dos tópicos mais discutidos globalmente pela cadeia de proteína animal. Mesmo considerando a dificuldade de prever a movimentação do vírus na Ásia e em outas regiões – assim como também ainda não está claro o momento em que haverá o desenvolvimento de métodos de fato eficazes de combate ao vírus –, podemos analisar alguns aspectos que trazem como consequência oportunidades para as exportações brasileiras de carnes. Claro, desde que o País se mantenha livre do vírus.

A importância da China na produção de carne suína e os impactos globais
De acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), o mundo produziu cerca de 113 milhões de toneladas de carne suína em 2018. Quase a metade dessa quantidade (54,2 milhões de toneladas) foi produzida pela China – mais que o dobro da produção da União Europeia e quase 15 vezes mais que a produção do Brasil, que é o 4º maior produtor de carne suína do mundo (veja figura 1). No âmbito internacional, também de acordo com o USDA, no ano passado, foram comercializadas mais de oito milhões de toneladas de carne suína entre países, sendo a China o maior importador.

A relevância desse país na produção mundial de carne suína explica o motivo de tanta preocupação com a situação atual em relação à PSA no sudeste asiático. Assim, o caso já é considerado o driver mais relevante na precificação mundial de carnes, principalmente em países exportadores e importadores.

O primeiro surto de PSA da atual crise na China foi reportado em agosto de 2018. Desde então, o número de casos só aumentou e o vírus se espalhou também por outros países asiáticos produtores de carne suína, como o Vietnã e a Coreia do Sul. No final de setembro, a China tinha contabilizado oficialmente 158 surtos de PSA em 32 províncias. A extensão dos impactos ainda é difícil de calcular, mas projeções têm indicado queda de cerca de 25% da produção na China (quase 15 milhões de t) em 2019 e, provavelmente, mais 10% a 15% em 2020 (veja figura 2).

Apesar de casos já reportados na Bélgica, a situação no momento se mostra sob controle no oeste europeu. De toda forma, vale destacar que a situação não está controlada em países do leste europeu. Assim, apesar de atualmente ser considerada de baixa probabilidade, a eventual chegada do vírus em países como Alemanha e França teria o potencial de impactar brutalmente o comércio internacional de carnes.

Impactos positivos para o Brasil
Como resultado da queda na oferta global, as exportações brasileiras de carne suína devem crescer acima de 20% em 2019 e 2020. A China vem sendo o principal destino da carne suína brasileira em 2019, com 157,5 mil toneladas exportadas (acumulado de janeiro a setembro), aumento de 33% em relação ao mesmo período do ano passado. No entanto, o Brasil ainda é um player pequeno no total importado pela China, conforme ilustrado na figura 2.

Também é importante destacar que, como a demanda chinesa supera a atual oferta de carne suína no mercado internacional, a China tem aumentado as compras de outras carnes para, assim, substituir parcialmente o gap de carne suína. Dessa forma, o maior apetite chinês por carnes no mercado internacional tem alterado o patamar de preços globalmente.

Como consequência, com o aumento das exportações brasileiras, os preços no mercado local também têm registrado altas relevantes. Em setembro deste ano, o preço médio da carne suína (carcaça especial) estava 20% acima do valor registrado em setembro de 2018. Assim, com margens mais positivas, a expectativa é de aumento da produção da carne suína brasileira em até 6% em 2019, de acordo com projeções realizadas pelo USDA. No entanto, observa-se que projeções no mercado têm variado entre 2% e 6%. Já para 2020, há consenso sobre um ambiente mais positivo e a expectativa é de incremento de até 5% na produção de carne suína no Brasil (veja figura 3).

É importante mencionar que os preços da carne suína na China têm registrado níveis recordes nas últimas semanas. Com isso, o governo chinês vem intervindo para conter avanços ainda maiores, com a venda de suas reservas de carne congelada, o que evidencia a necessidade de a China importar ainda mais carne suína (e outras) em 2020.

O patamar e a duração da crise, no entanto, ainda não estão claros. Além da carne suína, a China também tem aumentado a importação de outras carnes do Brasil. As exportações de carne de frango para a China, por exemplo, cresceram 21% entre janeiro e setembro de 2019, em relação ao mesmo período de 2018. Na mesma comparação, as exportações de carne bovina cresceram 11% para a China e as de carne suína, 33%. Considerando a capacidade e a velocidade de ajuste, além da estrutura de mercado, a cadeia da carne de frango deve ser a maior beneficiada pela oportunidade no Brasil.

Como ponto de atenção, há o risco do aumento da capacidade de produção como resposta a um evento pontual, que pode não representar uma situação estrutural de mercado em longo prazo. Além disso, existem projetos concretos de profissionalização da indústria de carne suína na China, que tem como objetivo em longo prazo diminuir a necessidade de importação.

Outra fonte de incertezas é a guerra comercial entre a China e os Estados Unidos. Recentes conversas divulgadas entre os dois países mostram que, ao menos para a carne suína, a China deve ceder nas tarifas comerciais para aumentar a sua capacidade de importação e, assim, ter mais fontes para minimizar a falta de oferta de proteína animal no país.

De toda forma, vale ressaltar que ainda não há uma solução para conter o vírus de maneira eficiente, o que pode estender o impacto na produção global e aumentar as oportunidades de exportação de carnes para países afetados pela PSA. Além disso, o Brasil, como um dos maiores produtores de grãos e carnes do mundo, também se destaca como um dos mais competitivos na produção de proteína animal, o que traz vantagens comparativas em um mercado globalizado.

Assim, fica evidente que a crise causada pela PSA trará oportunidades em curto prazo para países produtores não afetados pelo vírus.

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