Mylene Abud
À frente da Asbram – Associação Brasileira das Indústrias de Suplementos Minerais desde o início do ano, o zootecnista Fernando Penteado Cardoso Neto tem várias metas. Uma delas é divulgar o trabalho realizado pela entidade e elevar o quadro de associados para uma centena de associados – marca que está perto de ser alcançada, pois, desde que assumiu a presidência, já conseguiu três novas indústrias filiadas, que passaram de 88 para 91.
Outra é continuar levantando a bandeira da associação pela isenção do Pis/Cofins sobre produtos de nutrição animal destinados a bovinos. Projeto que, se aprovado, trará benefícios para toda a cadeia. “Vai melhorar o custo do produto e o pecuarista vai usá-lo mais. O aumento do uso vai melhorar o desempenho, que vai melhorar o desfrute, vai baixar o preço da carne e aumentar o consumo”, afirma.
Fernando faz parte de uma família de produtores rurais e empresários do agronegócio. Seu pai, Fernando Penteado Cardoso Filho, também ocupou a presidência da Asbram, em 2008. Nascido na capital paulista, estudou em Minas Gerais, onde se graduou pela Universidade de Agronomia e Veterinária de Uberaba (FAZU). Atualmente, também é presidente da Connan, fundada pelo pai, sediada em Boituva/SP.
Para ele, o maior desafio do setor é colocar os suplementos nutricionais no cocho e na quantidade certa. O produto, explica, chega até a fazenda, mas não é reabastecido todo dia ou toda semana. E como a falta do produto no cocho não leva o animal a óbito, o pecuarista não sente essa diferença. “Acho que falta essa conscientização de todo o pessoal da fazenda, de que, se isso for feito com maior frequência, aumentará o consumo do produto e, com certeza, trará benefício para o negócio”, disse Fernando, na entrevista que você confere a seguir.
Noticiário – Em sua gestão, o sr. disse que pretende ajudar a Asbram a conquistar uma centena de associados. Que ações a entidade pretende fazer para bater a meta?
Fernando Penteado – A associação é muito bem-vista pelo trabalho que vem fazendo nos últimos anos, as empresas têm procurado a Asbram para entender melhor o mercado. Hoje, reunimos de 60% a 70% das indústrias brasileiras produtoras de suplementos para a pecuária em todo o território nacional. Vamos ampliar as ações de relacionamento com as empresas não associadas divulgando nosso trabalho sério e transparente e as nossas reuniões mensais com profissionais do mercado que agregam conhecimento, entre outras.
Noticiário – Que outros objetivos estão na sua pauta para o biênio 2024-2025?
Fernando Penteado – Continuar o trabalho que vem sendo feito nas últimas gestões, como buscar a isenção do PIS/COFINS, uma pauta muito relevante, e o tema da sustentabilidade, importantíssimo para setor. A pecuária vem sendo criticada, mas não é realidade. Temos um trabalho muito bem pautado, feito na gestão do Juliano Sabella, sobre sustentabilidade. É preciso manter os associados atualizados com o que vem acontecendo no mercado e as perspectivas trazidas por profissionais relevantes, com números e informações precisas, e não fake news.
Noticiário – Quais os principais desafios atuais do setor? O que podemos esperar para o mercado de suplementos minerais em 2024?
Fernando Penteado – Pensando no ciclo da pecuária, estamos na fase de melhorias. Acreditamos que 2024 seja o ano da virada do ciclo. Imagine uma roda-gigante, nós estamos embaixo dela e a tendência é começar a subir. O ciclo do setor de animais de grande porte é mais demorado. E achamos que 2025 e os anos seguintes serão bem melhores, e que chegaremos ao topo dessa roda-gigante em 2028. É claro que o pecuarista que se estruturar antes, que utilizar as tecnologias não só de suplementação, mas também na melhoria das pastagens e em genética, vai usufruir disso mais cedo.
Noticiário – A suplementação de bovinos evoluiu muito desde a década de 1950, quando era comum ter apenas sal branco nos cochos. Hoje ainda há resistência quanto ao uso de suplementos nutricionais e de sua correta utilização?
Fernando Penteado – Acredito que não seja a resistência do pecuarista, acho que o problema logístico é o maior desafio. Não é o caminhão e nem a entrega, mas colocar o produto no cocho. As fazendas são muito grandes, por isso o rodeio no gado não é feito com muita frequência. O que vemos é que o produto chega até a fazenda, mas não é reabastecido todo dia ou toda semana. E como a falta do produto no cocho não leva o animal a óbito, o pecuarista não sente essa diferença. O gado de corte não tem uma medição diária como leite, frango, suínos, ela é muito espaçada. Na pecuária leiteira, por exemplo, todo dia a vaca vai para a ordenha e, se não alimentá-la corretamente, no dia seguinte já sente diferença na quantidade e qualidade. No corte, quando pesa o gado, já se passou muito tempo, e o produtor não percebe que a falta da suplementação faz diferença. Então, acho que falta essa conscientização de que, se isso for feito com maior frequência, aumentará o consumo do produto e, com certeza, trará benefício para o nosso cliente pecuarista.
Noticiário – Em momentos de crise, alguns criadores cortam investimentos em nutrição para diminuir custos; outros acham que não precisam suplementar o ano todo. Qual o problema dessa estratégia?
Fernando Penteado – A suplementação é muito bem-vinda em qualquer período do ano. Na época das águas, ela é fundamental. É como empurrar um carro ladeira abaixo, você vai ganhar velocidade, o animal vai ganhar mais peso, converter mais, claro que com um custo-benefício melhor. Mas na época da seca, ela também é importantíssima, porque o pasto não oferece tudo aquilo que o animal precisa. Para evitar o efeito sanfona, que é engordar nas águas e emagrecer na seca, a suplementação é essencial como estratégia na seca para não perder o rendimento das águas. Hoje existe suplementação até para ganhar peso na seca, e essa tecnologia as empresas associadas à Asbram levam para o campo. As empresas de nutrição têm produtos para todas as categorias e todas as épocas do ano. A gente leva essa informação, mas, muitas vezes, isso não acontece na prática. O pecuarista não percebe os ganhos porque não mensura. Muitas vezes, não utiliza como deve ser usado, que é colocar no cocho com mais frequência. Além disso, é necessário cuidar bem do pasto. Sem pasto de qualidade, não tem boa suplementação.
Noticiário – Na sua opinião, também é preciso melhorar a gestão nas fazendas?
Fernando Penteado – A gestão tem melhorado bastante nos últimos anos, mas em razão da pecuária de corte ser uma atividade de longa duração e por também praticamente não existir a morte dos animais por falta da suplementação, isso é empurrado com a barriga. Mas não deveria ser. Hoje, em uma fazenda que usa alta tecnologia em suplementação, o gasto com nutrição representa de 30% a 35% das despesas. Em uma de baixa tecnologia, cerca de 10% a 15%. Quando o preço da carne cai, a primeira coisa que o pecuarista põe na cabeça é gastar menos. Quando sobe, investe em tecnologia. Só que, como o ciclo é demorado, quando ele tiver um animal pronto para usufruir do preço bom, ele vai se esquecer disso. Tem que manter a qualidade da tecnologia sempre para, quando vier o momento bom, ele estar preparado e aproveitar.
Noticiário – A suplementação correta do rebanho contribui para a sustentabilidade da pecuária de corte e de leite?
Fernando Penteado – Melhorar o desempenho está totalmente ligado à sustentabilidade. Com uma boa suplementação, o ciclo dos animais no pasto vai diminuir, eles vão ser abatidos mais cedo. Estamos sempre atentos para melhorias que podem ser feitas dentro da porteira, em levar isso ao cliente e ser mais uma opção de sustentabilidade, e não só uma recria rápida. A sustentabilidade é uma somatória de pequenas atitudes. E a nutrição é uma delas. A pecuária sustentável vai mais além, inclui também melhoramento genético, pastos de melhor qualidade, manejo dos animais.
Noticiário – Como o sr. já mencionou, uma das principais lutas da Asbram é pela isenção do Pis/Cofins sobre produtos de nutrição animal destinados a bovinos. Quais seriam os impactos da aprovação desse projeto?
Fernando Penteado – Vai melhorar o custo do produto e o pecuarista vai usá-lo mais. O aumento do uso vai melhorar o desempenho, que vai melhorar o desfrute, vai baixar o preço da carne. É bom para a cadeia como um todo. Já existem conversas nesse sentido em Brasília, foram apresentados dois trabalhos mostrando esses números e a viabilidade da isenção do Pis/Cofins. A luta é grande, e não vai ser fácil, porque estamos falando de um setor que fatura em torno de R$ 16 bi, e quando tira 9,25% desse valor, o cofre diminui. Mas o que é preciso entender é que vai gerar mais produto, mais carne, mais demanda e aumentar o consumo. É uma pauta relevante para o nosso setor e estamos tentando achar os caminhos.
Noticiário – Segundo o IBGE, o país tem cerca de 234 milhões de cabeças de gado e, dessas, apenas cerca de 100 milhões são suplementadas corretamente. O que falta para mineralizar todo o rebanho brasileiro?
Fernando Penteado – Colocar o produto no cocho. Ele chega até a fazenda, mas não está sendo usado corretamente. Não está sendo colocado à disposição do animal aquilo que ele precisa. Uma conta básica feita pela própria Asbram: se pegar o consumo médio de um mineral, que é de 100g/cabeça/dia, o que é vendido hoje pelas indústrias representa 50g/cabeça/dia. Não chega a esse número porque não é colocado no cocho. É uma luta grande, mas está muito perto de ser alcançada. Desde 1950 é falado que o ideal é consumir de 80 a 100 gramas/cabeça/dia. Até 20 anos atrás, a gente via fazenda consumindo sal branco e, hoje, praticamente todas usam sal mineral, porém não na dosagem correta. É preciso colocar o produto no cocho conforme a indicação do fabricante. Se isso acontecer, do dia para a noite o consumo vai dobrar e chegar ao ideal. O pecuarista precisa estar ciente de que uma boa suplementação traz benefícios em todos os índices da fazenda.