Cristina Simões Cortinhas
Coordenadora do Hub de Oportunidades Supervisora de Inovações e Ciência Aplicada Ruminantes dsm-firmenich
Marcelo Grossi Machado
Gerente Leite Latam dsm-firmenich
O impacto do estresse calórico na produtividade, saúde e bem-estar dos animais de produção é uma preocupação crescente, especialmente pelo grande aumento nas temperaturas em todo o globo terrestre nos últimos anos. No Brasil, essa situação parece ser agravada, pois o número de ondas de calor aumentou de 7 para 52, de 1960 a 2020, e as temperaturas aumentaram em até 3ºC, nos últimos 60 anos, em algumas partes do país. Se nós já estamos sentindo na pele as mudanças climáticas, imaginem nossas vacas! O estresse calórico pode impactar negativamente o funcionamento biológico da vaca, incluindo a produção de leite, a saúde e a reprodução, sendo capaz de reduzir a qualidade de vida e até levar à morte, quando muito severo.
O estresse calórico ocorre quando o calor produzido pelos processos biológicos, somado ao calor absorvido do ambiente, excede a capacidade de a vaca perder calor. Cabe ressaltar que, ao longo dos anos, com o melhoramento realizado para a alta produtividade, o metabolismo da vaca também se tornou mais vigoroso e estas ficaram menos resilientes às mudanças nas condições climáticas.
Um dos índices mais utilizados para avaliar o estresse calórico na pecuária leiteira é o Índice de Temperatura e Umidade do ambiente ou ITU. De acordo com o ITU, a vaca pode ser classificada como submetida ao estresse calórico de leve a severo (figura 1). Como consequência à elevação do ITU, em seus diferentes níveis, a temperatura corporal da vaca sobe, desencadeando uma série de mudanças fisiológicas para reduzir a carga excessiva de calor no corpo.

De fato, a vaca lança mão de uma variedade de mecanismos adaptativos para eliminar o excesso de calor do corpo, que incluem o aumento da frequência respiratória, aumento na sudorese, redução da produção de leite, vasodilatação e diminuição do desempenho reprodutivo. Estudos na área do entendimento dos processos fisiológicos, bioquímicos e endócrinos envolvidos com esses mecanismos adaptativos e o desenvolvimento de tecnologias com capacidade de mitigar os efeitos do estresse calórico estão se intensificando. As respostas fisiológicas se iniciam no sistema nervoso autônomo e são coordenadas por ele, que é o responsável pelo controle involuntário das funções corporais.
Resumidamente, o sistema nervoso induz alterações hormonais, incluindo a liberação de glicocorticoides, aumento no cortisol, redução na prolactina e alteração nos hormônios da tireoide, entre outros, que diminuem a taxa de metabolismo na tentativa de reduzir o calor produzido. Outros hormônios são produzidos para a redução da excreção urinária. Custos energéticos de manutenção aumentam, o apetite e o consumo reduzem e a vaca diminui seu balanço energético. No fígado e no pâncreas, aumentam a liberação de hormônios para elevar a glicose disponível. Há uma queda na produção de saliva, redução na absorção de ácidos graxos voláteis, redução no pH do rúmen e aumento na entrada de endotoxinas na circulação sanguínea. A barreira intestinal é prejudicada e há menor aporte de oxigênio para as células intestinais, causando pela dilatação periférica dos vasos sanguíneos, e o estresse oxidativo, aumentando ainda mais a entrada de endotoxinas no sangue e, também, os processos Inflamatórios. Há aumento no catabolismo muscular e a vaca perde peso. A imunidade da vaca é prejudicada e aumenta-se o risco de ocorrência de distúrbios, como a cetose, acidose e laminite. Durante todo esse processo, há uma alteração na função das células epiteliais mamárias e redução no fluxo de nutrientes para a glândula mamária, com a redução na produção de leite e composição. A eficiência do sistema reprodutivo cai e as reprodução fica prejudicada (Sammand et al, 2020).
De acordo com uma compilação dos resultados de 31 estudos realizados, avaliando a produção e a composição de leite de vacas submetidas ao estresse calórico, há uma queda de 17,9% na produção de leite corrigido para gordura, redução na produção de proteína do leite de 3,9% e redução no consumo de dieta de 19,3%, variando de acordo com o estágio de lactação da vaca (Chen et al, 2024). E não para por aí: as perdas na taxa de concepção das vacas no verão podem chegar a cair para 20% ou até menos. Estudos sobre prejuízos econômicos com estresse calórico apontam perdas ao redor de até 383 dólares por vaca por ano no estado do Texas, e de 1,5 bilhões de dólares anuais nos Estados Unidos (St-Pierre et al, 2003).
Para reduzir os impactos do estresse calórico, ferramentas de manejo ambiental, como ventiladores, nebulizadores e dimensionamento adequado das instalações, são utilizados. No entanto, o manejo ambiental para redução do estresse calórico deve sempre ser associado ao manejo nutricional, para se obter uma maior eficiência na mitigação de seus impactos negativos. Nesse contexto, compostos fitogênicos passaram a merecer especial atenção, por terem propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes, antimicrobianas e imunomodulatórias. Esses compostos têm substâncias de origem vegetal que incluem plantas inteiras, ervas/especiarias em pó e óleos essenciais específicos.
Para comprovar esses efeitos, alguns pesquisadores suplementaram bezerras com o fitogênico Digestarom e as submeteram a uma onda de estresse calórico de sete dias (Wiranmakham et al, 2023). Os principais resultados mostraram que o uso do fitogênico formou a redução numérica no cortisol plasmático, hormônio relacionado à situação de estresse, como o calórico, redução de 38% na concentração de lipopolissacarídeos, endotoxina que entrou na corrente circulatória, e redução de 44% na haptoglobina, que indica uma diminuição nos processos inflamatórios, além de um aumento na quantidade de oxigênio no sangue (p<0,2). Estes resultados demonstraram que o uso do fitogênico reduziu os efeitos do estresse calórico no estresse oxidativo e nos processos inflamatórios.
Outras estratégias nutricionais eficazes na mitigação dos efeitos do estresse calórico são as leveduras, vitaminas, como a niacina, e minerais, como o cromo e o zinco. De forma geral, as leveduras vivas removem oxigênio do rúmen, melhoram a digestão das fibras no rúmen, estabilizam o ambiente ruminal, e as leveduras mortas são fontes de metabólitos solúveis com funções prebióticas, que estimulam o crescimento de bactérias fibroclíticas, além de melhorar o sistema imune. Devido a sua funcionalidade, elas podem melhorar o consumo e o fluxo de nutrientes pós-ruminais, que são necessários para a síntese de leite, sendo assim uma ferramenta útil para minimizar os impactos do estresse calórico.
Em um estudo realizado no Brasil com leveduras vivas, durante o verão (mais de 39% do tempo com ITU acima de 72), as vacas suplementadas com leveduras produziram 1,3 kg de leite a mais, apresentaram uma redução na taxa respiratória, aumento na glicose e na niacina do plasma, comparativamente às vacas sem leveduras (Salvati et al., 2015). Os autores concluíram que, com a melhora na regulação da homeotermia, houve maior disponibilidade de glicose para a síntese de lactose e leite. A suplementação de levedura pode ter estimulado a síntese de niacina no rúmen e a niacina tem efeitos no metabolismo lipídico e na vasodilatação, o que ameniza os efeitos do estresse calórico. Em outro estudo, a cultura de levedura morta aumentou a niacina plasmática, na mesma magnitude que em estudos com niacina protegida, além de reduzir a frequência respiratória, a temperatura retal, aumentar a glicose e melhorar a eficiência alimentar (Dias e t al., 2017).
A síntese de ácido nicotínico no rúmen pode não ser suficiente para atender às necessidades da vaca sob estresse calórico. Partindo desse princípio, alguns autores suplementaram vacas em estresse calórico com o uso de niacina (ácido nicotínico) (Di Constanzo et al, 1997). O ácido nicotínico reduziu a temperatura da pele das vacas em estresse moderado a severo, no entanto, não houve efeito na produção de leite. Em outro estudo, com a suplementação de niacina protegida, houve aumento na taxa de sudação e redução na temperatura vaginal e retal, sem efeito na produção de leite (Zimbelman et al, 2010).
O cromo diminui os impactos do estresse calórico, por melhorar o metabolismo energético da vaca. A suplementação com cromo levedura para vacas submetidas ao estresse calórico reduziu a temperatura retal, a taxa respiratória, aumentou a glicose e diminuiu a insulina plasmática, o que levou a um aumento na produção de leite de 2,6 kg por vaca por dia (Wo et al, 2023). Além disso, nesse mesmo estudo foi observada redução no hormônio T3 e aumento no T4, redução numérica do cortisol e aumento na niacina plasmática, o que levou os autores à conclusão de que o cromo diminui os efeitos do estresse calórico por atuar na função endócrina quanto no metabolismo da glicose (Wo et al, 2023).
Partindo-se da hipótese de que o estresse calórico aumenta a apoptose das células mamárias, morte celular programada, que prejudica as junções estreitas dessas células, o uso de zinco tem função na proteção da permeabilidade do epitélio e na integridade dos substratos basais, e diferentes fontes de zinco para vacas submetidas ao estresse calórico foram testadas (Weng et al, 2018). O resultado foi uma menor concentração plasmática de lactose com o uso do zinco orgânico, sinalizando melhor integridade na barreira do epitélio mamário.
Pensando nos benefícios citados acima, a dsm-firmenich desenvolveu o Victus Thermo, primeiro composto por seu blend fitogênico, Digestarom, pelos Minerais Tortuga, pela niacina e por leveduras. O Victus Thermo foi idealizado como uma ferramenta para amenizar os impactos do estresse calórico e, com isso, aumentar a produção de leite.
Recentemente, o Victus Thermo foi testado em uma pesquisa realizada em parceria com o Laboratório de Pesquisa em Bovinos de Leite / USP, e seus resultados foram apresentados na reunião do ADSA, em Kentucky/EUA. O teste foi realizado em Pirassununga/SP no verão e o ITU médio foi de 72. Nos resultados, o Victus Thermo reduziu a temperatura vaginal, o que demonstrou seu efeito na redução do estresse calórico, aumentou a produção de leite corrigido para gordura em 3,8 kg por vaca por dia (figura 2) e a eficiência alimentar em 11,6% (Chesini et al, 2025). Os resultados desse desenvolvimento não poderiam ser diferentes e comprovam que o Victus Thermo é uma ferramenta eficaz na redução dos impactos do estresse calórico e que é capaz de proteger bem-estar e a lucratividade da produção de leite.

REFERÊNCIAS:
Chen et al, 2024. Effects of heat stress on feed intake, milk yield, milk composition, and feed efficiency in dairy cows: A meta-analysis. J Dairy Sci.107(5);3207-3218.
Cheschini et al. 2025. Performance of cows fed a blend of additives during the summer. In: ADSA Annual Meeting, Louisville, KY
Di Costanzo et al, 1997. Supplementation of nicotinic acid for lactating Holstein cows under heat stress conditions. J Dairy Sci. 80(6):1200-6
Dias et al, 2018, Yeast culture increased plasma niacin concentration, evaporative heat loss, and feed efficiency of dairy cows in a hot environment. J Dairy Sci. 101(7):5924-5936. Salvati et al, 2015. Response of lactating cows to live yeast supplementation during summer. J Dairy Sci. 2015 Jun;98(6):4062-73.
Sammad et al, 2020. Nutritional Physiology and N Biochemistry of Dairy Cattle under the Influence t of Heat S Stress: Consequences and Opportunities. s Animals Basel). 3,10(5).793.
St-Pierre et al,2003, Economic Losses from Heat Stress by US Livestock Industries. J Dairy Sci, Volume 86, E52 -E77
Toledo & Dahal,2019. Recognizing Heat Stress in Dairy Cows: AN356, 6 2019″. EDIs 2019 (4). Gainesville, FL:2. https://doi.org/10.32473/edis- an356-2019.
Wickramasinghe et al, 2023. Effects of a phytogenic feed additive on weaned dairy heifer calves subjected to a diurnal heat stress bout. J Dairy Sci. 2023 Sep;106(9):6114-6127
Weng et al., 2028. Effects of heat stress and dietary zinc source on performance and mammary epithelial integrity of lactating dairy cows. J Dairy Sci. 101(3):2617-2630